Mais um espectáculo sangrento tem início para gáudio das centenas de espectadores sentados nas bancadas. No centro da ampla arena encontram-se frente a frente dois bravos guerreiros peritos na arte de matar. O primeiro, um homem alto e moreno, enverga sobre uma camisa de linho branco, uma pesada couraça de bronze que lhe protege totalmente o peito; os seus braços fortes e musculados estão totalmente expostos excepto nos pulsos onde duas braçadeiras de bronze ornadas com estranhos relevos lhe garantem uma parca protecção; as suas pernas bem constituídas estão cobertas por um pequeno saiote de tiras em couro e umas caneleiras em bronze que ilustram os mesmos relevos das braçadeiras; umas sandálias de couro protegem os seus pés da areia quente e desconfortável; e o seu rosto está protegido por um capacete de bronze embelezado com um penacho vermelho que não só o protege dos golpes à cabeça, mas que também lhe reduz o campo de visão; como armamento transporta na sua mão direita uma espada curta, gladius, e na sua mão esquerda um escudo redondo em bronze. O segundo, um núbio alto e de olhar feroz, não possui qualquer protecção, excepto no seu braço esquerdo onde uma uma braçadeira de escamas em metal o cobre por completo; uma simples toga branca cobre o seu sexo e os seus pés nús mergulham insensivelmente na areia escaldante; as suas únicas armas são uma lança de um metro e meio que segura com a sua mão direita e uma resistente rede de que está firmemente agarrada ao seu punho esquerdo.
As trombetas soam e o oficial responsável pela arena faz sinal para que o combate se inicie. Os dois homens saúdam a multidão e de seguida a si mesmos antes de iniciarem a peleja. A multidão vibra e solta gritos de apoio a cada um dos combatentes enquanto estes se testam mutuamente. Subitamente um grito de júbilo percorre as bancadas e a areia dourada e escaldante é tingida de um vermelho rubro. O primeiro sangue fora derramado e o verdadeiro combate tem agora início.
- Não há dúvida, a guerra termina e as coisas regressam rapidamente ao normal. - diz um jovem observando o violento combate que se desenrola diante de si.
- É verdade. - responde um homem entroncado e careca continuando a olhar para a sua espada sem sequer levantar os olhos. - Mas por um lado até é bom, se a maldita guerra continuasse eu ficaria sem emprego. - diz ele com um ligeiro sorriso.
- És um voluntário na arena?
- Sou, assim como a maioria dos que aqui estão. - diz levantando finalmente os olhos e olhando na direcção do jovem. - O tempo dos escravos-gladiadores já passou, davam muito trabalho e as revoltas eram frequentes. Agora somos todos profissionais.
- Sim, mas ser um gladiador, mesmo que profissional é uma profissão de risco, nunca sabemos se este será o nosso último dia.
- Ninguém vive para sempre, todos morremos um dia. E no fundo o risco está sempre presente, até mesmo os agricultores, ou criadores de gado que levam vidas pacatas podem morrer de um momento para o outro. Apenas os Deuses conhecem o nosso Destino. - diz ele serenamente voltando a observar a sua espada. - Tens medo da morte?
- Não... Apenas tenho receio de desperdiçar a minha vida em vão.
- Então não te inscreveste por vontade própria?
O jovem sorri e volta a observar o combate.
- Não. Fui hoje vendido ao teu senhor com escravo-gladiador. Deixei para trás boas amigas, pessoas que me marcaram e que espero, do fundo do coração, que estejam bem.
- Ah, percebo, estás então contrariado por ter de arriscar a tua vida, não é? Não te preocupes, o meu senhor é dos bons, terás boa comida, bebida, um bom quarto e uma bela mulher, homem, ou animal (depende dos gostos) com quem disfrutar bons momentos. E dentro em breve, se tudo correr bem, irás fazer muitos amigos aqui. - diz ele levantando-se e cortando o ar com a sua possante espada. - Espero que seja esse o Destino que te reservaram os Deuses.
- O meu Destino não é ser gladiador. - responde o jovem encarando de novo o seu interlocutor. - No entanto sinto que devo permanecer convosco durante algum tempo.
- Hm, quem te ouvir falar até parece que és capaz de sair daqui pelo teu próprio pé.
O jovem esboça um sorriso e volta a observar o combate.
- Apenas quando o meu Destino estiver claro. - murmura.
Um grito ecoa pela arena e a multidão explode em delírio. O combate terminara e o núbio saíra vencedor deixando a sua quebrada lança enterrada nas entranhas do seu adversário.
- Bom, parece que agora é a minha vez. - diz o homem virando-se para o jovem e estendendo-lhe a mão. - Sou Ajax.
- Chamo-me Cavaleiro. - respondo apertando-lhe a mão. - Desejo-te boa sorte e que Bellona te proteja.
- Ishtar, a minha Deusa é Ishtar. - responde com um sorriso. - E agora, observa e aprende.
As trombetas voltam a soar e um novo combate tem início.
domingo, setembro 09, 2007
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