quinta-feira, março 15, 2007

O Cofre (2ª Parte)

Assim que mergulho nas águas quentes e límpidas do Oceano Coralino a poção de Diana começa imediatamente a produzir os seus efeitos. O ar dos meus pulmões é expelido com uma brutalidade inimaginável e todo o meu peito e pescoço parecem inflamar-se causando-me dores indiscritíveis. Espasmos involuntários percorrem o meu corpo e uma agonia tremenda invade as minhas entranhas. O pânico e o medo abatem-se sobre mim, tudo à minha volta torna-se turvo e negro e a água penetra rapidamente pelas minhas narinas e pela minha boca sufocando-me e quase me levando a perder os sentidos. Mas depois, de repente, todo este tormento termina abruptamente e dou por mim a flutuar tão naturalmente como um peixe e a respirar tão casualmente como se estivesse na superfície. Suspiro de alívio e sorrio, a poção funcionou e tal como a Diana disse, posso nadar e respirar como uma criatura aquática, é pena que não me tenha avisado sobre o custo de tal transformação.
Com renovada confiança retiro do bolso o mapa amarelado tratado com resina e traço a minha rota, ao que parece esta irá levar-me até um veleiro, que segundo as lendas, se perdeu e se afundou no meio de uma terrível tempestade. O nome dessa embarcação perdeu-se no tempo, mas o seu conteúdo, ao que parece, ainda permanece enterrado no meio dos destroços. Volto a dobrar o mapa com cuidado e guardo-o no bolso, pela minha mente salpicam imagens de ferozes lutas corpo a corpo em pleno alto mar, de romances impossíveis e de tesouros e cargas tão extraordinárias e exóticas que deixariam um Jinni de boca aberta. Afasto estas imagens do meu pensamento e concentro-me apenas no que realmente interessa, encontrar o cofre e através dele encontrar as respostas que procuro.

Os mares do Sul são ainda mais belos do que eu imaginava: as suas profundezas estão cobertas por uma camada de fina e macia areia branca repleta de pedrinhas e conchas de várias formas e feitios; cardumes de peixes coloridos nadam tranquilamente ao sabor das correntes realizando coreografias complexas e extraordinárias como se dançassem ao som de uma música fantasma; as algas, verdes, vermelhas e azuis, presas às rochas, ondulam suavemente, indiferentes ao que se passa em seu redor; e por fim, os corais, O Grande Recífe, como lhe chamam os locais, aparece vindo do nada explodindo de cor e vida diante dos meus olhos.
Deixo-me ficar por longos minutos a observar todo este espectáculo, toda esta paisagem aquática de rara beleza, até que por fim, ciente da minha missão, viro a minha atenção para o mapa e procuro no horizonte um vestígio do navio. Sorrio ao ver um enorme pedaço de madeira, provavelmente um mastro, bem perto do local onde o mapa e as lendas assinalam o trágico naufrágio. Alguns metros adiante encontro finalmente o navio, aparentemente bem conservado, mas com grandes rombos no casco.
Entro no navio através do porão e após uma cuidadosa pesquisa deduzo que o cofre não se encontra ali. Tenho pena de deixar vários baús e barris selados para trás, mas a madeira está podre e qualquer impacto pode transformar este pacato navio num túmulo aquático. Não me resta outra alternativa senão explorar o camarote do capitão e tentar a minha sorte.

O camarote parecia ter sido muito bonito, mas agora está completamente arruinado, toda a divisão está repleta de musgo e de pequenos animais que se afastam rapidamente quando me aproximo, no entanto, algo me chama a atenção, os livros e os mapas estão em perfeito estado de conservação, ao que parece o capitão devia ser um experiente lobo do mar e tomou o cuidado de revestir todos os papéis e tomos com uma resina especial que os protege da água. Curioso, dou uma vista de olhos aos mapas, mas sendo o meu conhecimento náutico e de matemática, limitado ou quase nulo, rapidamente os coloco de lado. Viro, então, a minha atenção para os livros, mas cedo descubro que a maioria deles se trata de romances e/ou livros técnicos, o que me deixa ainda mais desapontado, no entanto, encontro no meio da confusão o diário do capitão, o que pode vir a ser bastante valioso, por isso decido levá-lo comigo. No entanto, não encontro sinais do cofre e começo a pensar que toda a minha busca irá terminar num autêntico fracasso.
Abandono o navio bastante desapontado. Sem pistas para me guiar, parece que terei de regressar de mãos vazias.
- Que procuras tu? - pergunta uma voz no interior da minha cabeça. Espantado olho em volta e observo por debaixo de mim algo, ou alguém, com uma forma difusa que se aproxima. Tento falar, mas descubro que perdi tal capacidade. - Não te esforces a tentar falar, criatura da superfície, faz como eu, usa a tua mente. - A forma com voz doce vai-se tornando cada vez mais distinta até tomar a forma de uma bela mulher de longos cabelos verdes, pele azulada e uns olhos negros muitos profundos.
- Quem és? - pergunto.
- Alguém com vontade de saber o que fazes aqui em baixo, criatura da superfície.
- Procuro um objecto.
- Que tipo de objecto, criatura da superfície? - a voz da rapariga torna-se tão doce que deixo escapar um sorriso.
- Um cofre, estava dentro daquele barco. - respondo com a sensação que devo confiar nela.
- Hm, um cofre? Acho que sei do que falas, criatura da superfície. - a rapariga sorri. - Sou eu que o tenho, anda, vem comigo, eu levo-te até ele.
Sem conseguir evitar acedo ao seu pedido e sigo-a.

14 comentários:

Anónimo disse...

Pois é Cavaleiro,

torna difícil resistir-se a tão doce apelo.

As musas da inspiração continuam contigo. É, como vem sendo habitual, um prazer ler-te.

Beijinhos
H.A.

Cavaleiro disse...

N sei, ultimamente parece q me viraram as costas, demorei 2 dias para escrever isto...

Bj terno

escrevinhador disse...

escreves excepcionalmente bem, de que sou leitor assíduo de este teu espaço, apesar de não comentar, erradamente.

um abraço

Anónimo disse...

Duvido muito Cavaleiro.
No entanto podem ter estado mais ausentes mas virar as costas a tão pessoa parece-me impossível.

Beijo terno
H.A.

Anónimo disse...

Passei só pra deixar um beijo... Espero que seja uma porção inspiradora. :)

Ana disse...

Muito bem criatura da superficie. lol
Vem sempre uma ajuda a caminho e valeu a pena demorares dois dias para escreveres ;)
beijinhos

Lia disse...

São dois mundos tão diferentes, mas que, por breves momentos, entram numa sintonia imperceptível.

As tuas musas acompanham-te sempre, e mesmo quando ausentes, fazem-se sempre sentir.

Já te disse uma vez, e corro o risco de voltar a repetir, mas consegues sempre surpreender-me.

Beijinhos meu doce cavaleiro,
A'laena sar

Toque sensual disse...

Hum... é a primeira vez que venho ao teu blog... e simplesmente adorei... simplesmente fantástico...!
Beijinho muito docinho...!

Anónimo disse...

Já tinha lido a 1ª parte e vim em busca da continuação!
Gostei muito. parabéns pela tua maneira de escrever!
E desde já desejo te um bom fim de semana!
**BJS**

Avid disse...

Cav,
Valeu a pena o tempo que demoraste...ficou lindo.
Bjs meus

P.S. Divas tambem sentem saudades...

Papoila disse...

Cavaleiro:
Criatura da superfície que não precisa de palavras para se entender com essa doce ninfa, que linda história nos contas.
Beijo

angel bar disse...

Olá Cav, poderoso como sempre, muitos beijinhos.

Ana disse...

Olá Cavaleiro desaparecido do meu blog lol.
Eu sei que a origem da palavra é um mito urbano mas não deixa de ser giro e é uma explicação simpática para uma palavra tão feiazinha lool
Ainda hoje vou colocar os melhores momentos do concurso e espero que apareças para dar uma espreitadela.
Beijinhos

Anónimo disse...

Olá Cavaleiro,

tenho saudades de ler-te.
Será que as tuas musas continuam a querer virar-te as costas?

Espreita:
http://kontraste.wordpress.com/2007/03/30/366conversas-de-caf-fantasy-cappuccino-conversa-93/
uma conversa em novembro, se não estou em erro, publicada recentemente...

Até um dia.

Beijinhos
H.A.