domingo, janeiro 20, 2008

Revelações

- Eu... Tenho uma coisa para te contar. - diz ela temerariamente colocando a bandeja com a ceia no chão e sentando-se num banquinho de madeira.
- E que coisa é essa? - pergunto esfregando os olhos e soltando um bocejo cansado. - Hm, pela tua cara parece ser coisa séria.
Sekhet desvia o seu olhar e morde o lábio inferior ao ouvir as minhas palavras.
- De certa forma é... É que... É que eu menti-te. - confessa ela a custo. - Bom, quer dizer, não foi bem mentir, foi mais, ocultar?
- E o que é que me ocultaste? - pergunto numa calma fingida trincando um pouco de pão com queijo.
- É... É difícil de explicar. Certamente acharias que sou maluca. - continua ela tentando sorrir enquanto passa nervosamente a sua mão pelo cabelo.
- Experimenta-me.
- Deves ter achado estranho a razão porque uma rapariga que tu nunca viste na vida, uma completa estranha, te escolheu como confidente e te revelou pensamentos e desejos íntimos.
- Confesso que isso me passou várias vezes pela cabeça, sim. - digo sorrindo.
- Pooois... A verdade é que... - Sekhet cala-se subitamente e olha para mim com uma expressão muito séria.
- Sim?
- Promete que não gozas comigo ou me chamas de louca!
- Porque haveria eu de...
- Promete, Cavaleiro!
- Ok, ok! Eu prometo.
- Obrigada. - diz ela suspirando de alívio e inspirando longamente logo de seguida. - Eu tenho visões.
- Visões?
- Sim.
- Do tipo: "vejo o futuro" e coisas do género?
- Duh! Claro! Que tipo de visões achavas que fossem?
- Pois, tens razão... - respondo meio embaraçado pela minha falta de perspicácia. - E o que vês nessas ditas "visões".
- É difícil de explicar. São muito confusas e aparecem em qualquer altura. Geralmente são flashes curtos e enigmáticos.
- Mas o que é que eu tenho a ver com isso?
- Não é óbvio? - diz ela sem paciência. - Apareces nelas.
- Sim, até aí já eu percebi. O que eu queria saber é o que é que te fez confiar tanto em mim.
- Bom... Erm... Não sei... - diz ela corando.
- Não sabes?
- As visões são muito confusas e rápidas. Sei que fazes parte do meu destino porque te vejo a meu lado. E não! Não é dessa maneira! Tu ajudas-me, defendes-me e cuidas de mim. Por vezes vejo-nos em combate juntos, outras vezes vejo-me nos teus braços, é como se estivesse ferida ou exausta e tu me estivesses a dar palavras de alento e de incentivo, entendes?
- Começo a entender. Continua.
- E é isso. Durante as esses vislumbres sinto-me bem ao teu lado, sinto que posso confiar em ti. - confessa ela corando de novo. - Eu sempre pensei que tudo isto fosse imaginação minha, fossem apenas sonhos e desejos de uma adolescente cativa, mas depois... Depois vi-te chegar e percebi que afinal não eram fantasias, eram sinais.
- Interessante. Falaste disto a mais alguém?
- Sim...
- A quem?
- Ao Thernion...
- Ao Thernion? Também o vês nessas tuas visões?
- Não sei, são confusas, muito confusas, percebes?
- Então porque razão lhe falaste delas?
- Bom, na verdade foi ele que veio falar comigo.
- Como assim?
- Não te sei dizer, é estranho. Foi como se ele tivesse vindo à minha procura.
- Estás a querer dizer que ele está aqui por tua causa?
- Sim... Não... Quer dizer... Oh, não sei! Eu não sei de nada, Cavaleiro! - desabafa ela abanando a cabeça. - É tudo tão estranho e confuso. Apenas sei que ele me tem ajudado muito. O Thernion percebe de magia.
- Um feiticeiro!? Isso explicaria muita coisa. - exclamo murmurando a última parte.
- O quê?
- Ouve, Sekhet, acho melhor afastares-te do Thernion, ele pode não ser boa companhia.
- Mas ele tem sido tão bom para mim, é um querido e tem-me ajudado tanto.
- Eu percebo, mas tu própria o disseste que ele veio à tua procura e além do mais é um feiticeiro, e esses tipos não são de confiança.
- Oh, mas tu estás a ser preconceituoso, lá por ser...
- Não, não estou. Conheço bem demais as manhas dos feiticeiros. Eles não são flor que se cheire. Poucos são aqueles em que se pode confiar. Se fosse a ti, eu...
- Não! Eu confio nele e tu não me podes proibir de o ver.
- Não te estou a proibir, estou apenas a...
- Olha esquece, não vale a pena! - diz ela levantando-se irritada. - Eu não te devia ter dito nada, devia ter deixado que as coisas corressem normalmente.
- Ouve, Sekhet, eu...
- Esquece, Cavaleiro, és tal e qual o meu irmão. Já sou crescida e já não preciso que me digam como viver a minha vida. Até amanhã! - dispara ela pegando no tabuleiro e saindo a correr pela porta.
- Espera...
Ora bolas, fizeste-a bonita, Cav. Hm, quem haveria de dizer a Sekhet é vidente e Thernion um feiticeiro. Se for verdade o que ela diz, que ele veio atrás dela, então receio que ela esteja metida numa alhada. Pelo sim, pelo não, é sempre bom mantermo-nos afastados dos assuntos dos feiticeiros, acabam sempre por nos arrastar para sarilhos, se não for para a própria morte. Eu ainda me lembro das minhas "aventuras", se é que lhes posso chamar isso, com a Diana. A sua curiosidade e sede de conhecimento atraíam-na para cada uma... Hm, como estará ela, bem espero eu, assim como a Lara e a Ela. Mas agora não é altura para pensar nelas, tenho que me concentrar neste assunto, tenho que descobrir mais sobre as visões de Sekhet, tenho que saber do que é que eu a estava a proteger e com quem, ou com o quê, lutava eu. Amanhã, amanhã eu tratarei disso. Terei que ter uma conversinha com esse Thernion, mas agora, agora vou é dormir porque amanhã será um longo e duro dia, tenho a certeza disso...

4 comentários:

Mariana disse...

É, gosto de Royo...
Tens de escrever mais.
Revelações interessantes.
bj

Liadan disse...

Ainda tenho um ano inteiro para ler, para trás, mas estou sinceramente a adorar...
A tua leitura é viciante.
Beijocas

Anónimo disse...

Andava à busca de cavaleiros e encontrei esta história. Achei espectacular! Tens um grande dom, o da escrita que nos faz levar a mundos e locais imaginários. Parabéns, muitos parabéns!

Denise Dória disse...

Hum.... Acho que comecei do fim para adiante. Mas até que ficou interessante assim. Estou curiosa. Será que o cavaleiro tem razões para desconfiar tanto de feiticeiros? Realmente é muito estranho que a linda (assim a imagino) vidente tenha sido, de súbito, procurada. Mas nem sempre as coisas são o que aparentam ser...

Continuarei as leituras.

Abraço.