quinta-feira, outubro 05, 2006

Unyard (4ª Parte)

Entro na câmara ansiando encontrar uma vez mais o espírito do feiticeiro, mas este não está lá, talvez tenha sido mesmo uma alucinação. Procuramos durante horas por uma saída ou por algo que nos possa ajudar, mas não encontramos nada de útil, apenas jóias e ouro, muito ouro, algumas armas encantadas mas que estão protegidas contra o roubo e muitos pergaminhos e livros repletos de feitiços.
- Caramba! - digo finalmente. - A Lilian iria adorar isto.
- Iria sim se ainda fosse uma feiticeira, mas ela agora é um anjo, já não faz magia. - diz Lara de costas para mim admirando as armas encantadas.
- A Lilian um anjo, hm, como gostaria de a ter visto nessa forma. - uma nuvem de pó grosso liberta-se quando fecho um livro de capa azul. - Bom, sem uma feiticeira estes livros e pergaminhos não nos irão ser úteis.
- Não há nada aqui que nos possa ser útil. - rosna Lara exasperada. - Armas encantadas que não podemos usar, magias que não sabemos controlar e ouro que nunca iremos poder gastar. Estamos aqui presos, Cav, presos!
- Calma, Lara, calma, ainda não vimos o sarcófago.
- Esse também não deve ter nada, apenas a gema que entregámos à Ursula.
- Não custa nada tentar, aliás, eu não te contei, mas quando resgatámos a gema eu vi-o.
- Viste o quê? O espírito do velho? - pergunta a demónio incrédula.
- Sim, por momentos vi-o, mas depois desapareceu. Estava a querer dizer-me algo, mas eu não percebi.
- E só agora é que mo dizes? Devias ter-me dito isso logo no início, Cav, não teríamos perdido este tempo todo.
- Como assim? Não me digas que consegues invocar e conversar com espíritos. - digo sorrindo.
- Hm, hm. - diz ela anuindo com a cabeça e aproximando-se do cadáver.
- Mas tu és um demónio e não um anjo, pensei que só os anjos tinham essa capacidade.
- Cav, os anjos e os demónios são feitos da mesma matéria, são como dois lados opostos da mesma moeda. Nós demónios fazemos o queremos, vivemos a vida de uma maneira egoísta, digamos assim, enquanto eles vivem para zelar pelo bem estar de todos, ou assim o dizem, pois no meu entender são uma cambada de orgulhosos que no fundo, no fundo querem é ser venerados. Basicamente temos os mesmos poderes, por isso é que as nossas guerras acabam sempre empatadas.
- Sim...
- Enfim, confia em mim humano, se eu te digo que sei falar com os mortos é porque o sei. Mais tarde conversaremos melhor, falar-te-ei de certas coisas sobre eles que vocês não sabem, vais ficar surpreendido e no final verás que eles não são assim tão bonzinhos como dizem ser. - a demónio pisca-me o olho e coloca a sua mão sobre o crâneo o feiticeiro começando a murmurar palavras incompreensíveis.

A sala fica gelada e um arrepio de frio percorre a minha espinha, a iluminação da câmara parece baixar consideravelmente e a sensação de um milhão de olhos a observarem-me de todos os lados invade-me. No canto da sala uma sombra começa a mexer-se, a princípio parece ser provocada pelo suave tremelicar da tocha, mas depois ganha forma e move-se na direcção da demónio.
- Quem me ousa acordar do meu sono eterno? - pergunta com uma voz sobrenatural.
A demónio morde o lábio e olha para mim antes de começar a falar.
- Uma demónio que precisa de ajuda. - diz ela num tom de voz quase imperceptível.
- Ajuda!? Um demónio? E porque haveria eu de ajudar uma criatura tão desprezível?
Noto um brilho de raiva no olhar de Lara que depressa desaparece.
- Porque os mortos-vivos que estavam presos neste vale foram libertados.
- Como? E quem foi que os libertou? Isto nunca deveria ter acontecido, nunca! Aquela bruxa não pode ficar à solta, tem de ser detida!
- Nós sabemos disso, mas precisamos de saber como é que a "matamos", se é que se pode matar algo que já está morto?
- Nós? Quem está aí contigo?
- Um humano. - diz Lara apontando na minha direcção.
Sem saber o que fazer, esboço um sorriso e cumprimento-o.
- E-eu conheço-te, t-tu devias estar morto. - diz ele numa voz trémula.
Lara e eu olhamos um para o outro.
- Mas garanto-lhe que estou bem vivo. Precisamos da sua ajuda, a gema branca foi destruída e agora não sabemos como deter esta ameaça.
- A gema... Sim, sim, temos de a impedir. Mas o preço vai ser alto de mais para mim.
- Como assim? - pergunta Lara.
A voz do velho feiticeiro torna-se fraca e cansada como se todo o peso do mundo fizesse pressão sobre ela.
- Terão de usar o diamante preto, uma jóia muito poderosa, mas que irá destruir todo este vale encantador. Quando digo tudo, digo mesmo tudo, vivos, mortos e almas.
- A Ursula e os seus esbirros afastaram-se quando o viram, parece que pressentiam o seu poder.
- Sim, ela sabe o que a pedra faz, mas desconhecia a sua presença. Aquela rameira, aquela traidora roubou-me tudo o que eu tinha de mais sagrado, por isso é que a amaldiçoei, a ela e a todos os seus seguidores. Infelizmente cresci nesta zona, este vale foi a minha casa durante longos anos, anos muito felizes, e por causa disso não fui capaz de o destruir. Mas esse era o meu destino, devia tê-lo cumprido, só os Deuses sabem quantos vivos foram corrompidos por ela...
- Como é que activamos o seu poder? - pergunta Lara pouco interessada na história do feiticeira.
- Hã? Paciência, minha filha, paciência. Eu sei que a minha história te aborrece, mas é tudo o que me resta.
- Não devemos ficar agarrados ao mundo dos vivos, feiticeiro, devemos aceitar a morte e partir.
- É fácil para ti dizê-lo, demónio, não conheces a morte nem a dor da separação de pessoas que amamos.
- Dizes tu, feiticeiro, dizes tu...
Olho para Lara intrigado, o que quererá ela dizer com aquilo?
- Mas tens razão, tudo não passa agora de memórias vãs, memórias de um espírito que já nem devia existir. Para activar a pedra terás de a colocar na mão de uma estatueta de ouro que se encontra na villa. A Ursula sempre desconheceu o propósito dessa estatueta e ainda bem, pois se soubesse o que ela faz muito certamente que já a tinha destruído.
- E como é que reconheço a estatueta?
- Simples, é uma réplica da Ursula. Irónico não acham?
- Muito. - digo sorrindo.
- E como é que saímos daqui, a entrada principal está guardada.
- Por debaixo do sarcófago existe uma passagem que irá dar directamente à villa, uma vez lá dentro procurem pela estatueta, que, tendo em conta o narcisismo da Ursula, deve estar no seu quarto.
- Obrigado. - diz Lara sorrindo.
- Uma vez activada a pedra esta ficará branca e terão apenas quinze minutos para fugir da aldeia, se não conseguirem serão totalmente destruídos.
O espírito desaparece momentos depois e seguindo as suas instruções afastamos o sarcófago e deparamo-nos com uma nova saída.

A villa parece estar desabitada, todos os cidadãos da cidade encontram-se à porta do templo esperando por nós. Não perdemos muito tempo a encontrar o quarto, este está logo ao lado daquele por onde entrámos, infelizmente, embora os seus esbirros estejam à nossa espera junto do templo, Ursula encontra-se no quarto admirando-se ao espelho.
- Ali está a estatueta. - sussurra Lara.
- Sim, mas como é que vamos passar pela feiticeira?
- Não te preocupes, eu trato disso, aquela cabra vai arrepender-se do dia em que ousou tocar-me.
Lara e eu entramos no quarto sem cerimónia, Ursula ao ver-nos lança um grito de espanto.
- Vocês? Mas como é que passaram pelos meus servos?
- Isso é uma longa história, mas se eu fosse a ti preocupava-me com o meu bem estar. - diz Lara desembainhando a espada.
Ursula sorri.
- És uma idiota se pensas que podes ferir-me com essa espada.
- Com esta espada? Não, só com ela não consigo, mas com a ajuda disto sim, aliás, com isto até te posso destruir. - a demónio sorri ao tirar de entre o seios o diamante negro.
A feiticeira solta um grito de terror ao vê-lo e recua tapando os olhos.
- Parece que o teu sorriso se desvaneceu, tu sabes bem que isto te pode matar, mas mais importante torna-te sensível aos meus golpes.
Ursula murmura um feitiço mas Lara desfere-lhe um golpe no braço descarnado quebrando a sua concentração e fazendo-a urrar de dor.
- Dói, não dói? - o olhar dourado de Lara parece deliciar-se com cada golpe e com cada grito de dor que é expelido do corpo moribundo da feiticeira. - Como te atreveste a tocar-me e a tentar matar-me? - grita a demónio deleitando-se com a tortura que inflingia na pobre mulher.
- Pára, pára, por favor pára. - implorava Ursula chorando copiosamente e encolhendo-se a um canto com as mãos protegendo o rosto, numa tentativa infrutífera de fazer parar a dor.
- Lara! - grito revoltado colocando a mão por cima do seu ombro. - Pára com isso, viemos aqui para a destruir, não para a torturar.
A demónio olha para mim, nos seus olhos dourados está estampado um brilho louco e nos seus lábios um sorriso de puro prazer.
- Ela merece, Cav, ela merece. - diz ela calmamente.
- Não, ninguém merece ser torturado, ninguém! - grito furioso arrancando-lhe das mãos o diamante.
A demónio não reage, observa-me sorrindo como se a minha fúria ainda a divertisse mais. Assim que coloco a pedra na estatueta esta torna-se branca e uma ligeira vibração faz tremer o candelabro.
- Pronto, agora é melhor fugirmos, não temos muito tempo.
- Antes de irmos há mais uma coisa que eu quero fazer. - diz a demónio olhando novamente para a Ursula. - Não a vamos deixar à solta, vamos acabar com ela.
Lara pega na feiticeira e sussurra-lhe algo ao ouvido, algo que não consigo ouvir mas que é dito com um sorriso nos lábios. Ursula geme e treme, mas antes que possa fazer algo a demónio aproxima-a da estatueta e encosta o seu rosto ao diamante. A feiticeira solta um grito pavoroso e eu sou obrigado a desviar o olhar enquanto o seu corpo é consumido por chamas brancas. Sorrindo maliciosamente Lara corre dali para fora na direcção da estalagem e dos nossos cavalos, sigo-a e minutos depois estamos fora da aldeia e do vale. Com um brilho intenso tudo é destruído e o vale outrora verde e cheio de vida torna-se agora negro e estéril.

5 comentários:

Nin disse...

Insisto: a Lara tá a virar bonzinha, mesmo que agora tentes disfarçar com uma pseudo-tortura ;)
Beijo e boa noite...

Cavaleiro disse...

Então tens de me explicar onde é q ela está a virar boazinha, pois embora ela seja uma coisa para cmg, para os outros sp foi outra.
Aliás, eu nunca considerei a Lara má, sempre a considerei como orgulhosa, arrogante, egoísta, sensual e com um enorme apetite sexual. Ela é um demónio e faz o q quer, por vezes o seu lado negro vem ao de cima, mas isso acontece com qq um...

Bj terno

Avid disse...

Lara..sempre me pondo em duvidas...bjs meus

Cavaleiro disse...

É uma demónio mt enigmática... :P

Bj terno
Cav

Cavaleiro disse...

Todos temos o nosso calcanhar de Aquiles, mas no caso da Lara penso q o seu será o orgulho.

Bj ternurento ;)